quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Grandes salteadores

Não há adjectivos suficientes para qualificar o que esta cambada que, tendo ganho com legitimidade, - embora até pudéssemos encontrar argumentos para a chamar de duvidosa - o direito de governar, mas que está no poder, abusando dele, tomando decisões para as quais os portugueses nunca a mandataria, numa actuação bem próxima da ditadura, levando milhares de cidadãos ao desespero, à miséria, sem que se vislumbre que os enormes sacrifícios possam valer a pena. Ainda se valessem… Atacam-nos, roubam-nos, sem oportunidade de defesa, que não seja manifestarmo-nos, indignarmo-nos e, quem sabe, um dia destes, termos uma nova revolução, talvez não dos cravos, mas dos crisântemos. Cambada de salteadores é o que são.
Entre o rol de mentiras que poderíamos apontar a Passos Coelho, que fazem dele um exemplar de Pinóquio, ao pé de quem, outros a quem já deram esse epíteto, ficariam muitos graus abaixo, não posso deixar de me recordar, perante tudo o que de mau já nos impôs e prometeu, da sua justificação para chumbar o PEC IV e que foi a de que não se podia pedir mais sacrifícios aos portugueses. Bom, ele realmente não pede. Impõe.
A minha revolta é tamanha e é alicerçada em vários aspectos sobre os quais poderia dissertar que necessitaria de horas e ninguém leria o meu desabafo. Há, todavia, dois ou três aspectos que não quero deixar de tocar, ainda que seja superficialmente.
Embora seja obrigado a reconhecer que é difícil, mesmo impossível, criar medidas perfeitas, em todos estes pacotes de austeridade, a justiça e a equidade, por mais que o afirmem que existe, isso é uma mentira. Se até Cavaco Silva, que se tem comportado como anjo protector deste governo o reconhece… De tão debatido que está o caso dos funcionários e aposentados da função pública, que são tratados como se fossem eles os grandes responsáveis pelo descalabro das finanças públicas, não vale a pena gastar muita saliva nem muita tinta, embora se deva dizer, em abono da verdade, que há muitos funcionários públicos, no activo ou aposentados, que deram milhares de horas a mais sem nunca receberem qualquer compensação por isso. Como no sector privado há bons e maus. Afirmar muito simplisticamente que os públicos trabalham menos horas do que os privados é uma falsa questão. Por isso, não se justifica que os trabalhadores do sector privado, ao contrário daqueles que o foram e agora estão aposentados, não contribuam com os cortes adequados nos respectivos subsídios, não para ficarem em poder dos patrões, mas para reverter a favor do saneamento das finanças do país. Bom, isto é o que eu penso que deveria ser feito, em nome da equidade, porque, de resto, o que deveria acontecer era não haver cortes dessa monta.
Deixe-me só fazer aqui mais uma reflexão. Diz-se que todas estas medidas de austeridade são para pagar as dívidas do Estado. Quem contrai as dívidas ou a quem elas beneficiam é que as deve pagar. Vivo com mais de dois mil conterrâneos numa terra – Nespereira, Cinfães – que, relativamente ao Estado, ao invés de contribuirmos para o pagamento da referida dívida, deveríamos ser indemnizados, tais são as carências que temos. De uma terra que é atravessada por uma estrada nacional miserável, estreita, com curvas atrás de curvas, de segurança reduzida, quando outras têm auto-estrada, às vezes mais do que uma, ou IP´s ou IC´s, que não tem saneamento básico nem água ao domicílio, longe dos estabelecimentos de ensino, de saúde, será que é justo que os seus cidadãos tenham de pagar a crise como outros que têm tudo à porta de casa? Não deveriam, antes, os meus conterrâneos ser indemnizados pelo ostracismo a que os votaram? Assim estaríamos mais perto da justiça.
É bom que toda esta gente e tanta outra em circunstâncias idênticas não deixem de exercer não apenas o seu direito de indignação, mas o direito de revolta.
A mim apetece-me usar a expressão que se usa por aqui: grandes sacanas.