sábado, 6 de março de 2010

Ensina-o a pescar

Liberto de compromissos profissionais e de outros a que durante muitos anos me devotei, hoje, o reflectir consome-me muito mais tempo do que o agir. Há um período da vida em que a acção se sobrepõe claramente à reflexão. Talvez, por isso mesmo, por não termos o tempo suficiente para pensar, nem sempre tomaremos as medidas adequadas, quando temos que agir. Se algumas vezes é verdade que poderíamos ser um pouco mais prudentes, poderíamos gastar alguns momentos para equacionar, outras vezes, não há lugar a qualquer tipo de espera, tem de se tomar uma resolução de imediato, muitas vezes indo ao arrepio de leis ou regulamentos. Vivi algumas situações do género e nunca hesitei em reagir de imediato, independentemente de estar ou não a cometer alguma infracção. Situações destas acontecem com alguma frequência quando se trata de operações de socorro. Nunca tive de me arrepender de nada e sempre transmiti aos meus subordinados a ideia de que em situações de emergência, não se pode esperar que o superior hierárquico seja contactado para se tomar uma decisão. Primeiro decide-se em favor da vida, depois dá-se conhecimento ao superior. Há uma coisa que, sobretudo quando se trata de vidas humanas ou património em risco, é mais importante do que qualquer lei ou regulamento. É o bom senso.
Feito este intróito, a minha reflexão de agora está virada para a expressão ajuda. Tínhamos aqui “pano para mangas”, se quiséssemos debater o tema até à exaustão. Bom, mas aqui não se trata de um debate, mas tão-só de uma reflexão para um blogue. Em questão está o conceito de ajuda, quem ajuda, quem é ajudado.
A ajuda de que muitos necessitam não é exactamente igual para todos. Às vezes as necessidades são opostas. Há quem necessite de uma palavra de carinho, de estímulo, de solidariedade, como há quem precise mais de uma palavra de recriminação, de apontar um caminho. Há quem necessite de ouvir dizer um sim, como há quem necessite de ouvir um não. Há quem apenas necessite de silêncio.
Quando se fala em ajuda, normalmente, o nosso pensamento conduz-nos logo para ajuda material, que não se traduz apenas no apoio pecuniário – pode sê-lo de muitas outras formas, como alimentos, roupas, equipamentos, etc. Sobretudo aqui é que eu entendo que se cometem muitos erros, desde logo porque o vil metal é extremamente sedutor. Nem sempre a oferta de dinheiro é a forma mais correcta de ajudar. Muitas vezes é extremamente perniciosa, porque alimenta a preguiça, a ociosidade, trava a criatividade, o engenho, o esforço. A sociedade, no entanto, aplaude quem dá, ainda que seja mal empregue e a pior forma de ajudar. Por sua vez, quem dá, ufano pelo gesto e pelos aplausos da turba, eleva a sua auto-estima, o que não é mau, e julga-se o mais importante à superfície da terra, o que é péssimo.
Poderia alongar-me bem mais sobre este aspecto da ajuda, mas fico-me por aqui. Vamos a outro aspecto, o da perspectiva de quem é ajudado. Ora bom, porque sabem que há sempre alguém que não tendo outros atributos, a começar pela inteligência e seriedade intelectual para alimentar o seu ego, estarão disponíveis para dar uns trocados ou uns objectos, alguns dedicam-se à madracice, não fazendo “a ponta de um corno” em termos de trabalho rentável. Se vivessem apenas à custa dos beneméritos-fautores-de-malandros, vá que não vá, o pior é que alguns deles ainda se dão ao luxo de comer à mesa dos nossos impostos. Este tipo de ajuda, que não é a que eu defendo, salvo algumas excepções, obviamente, faz felizes e contentes as duas partes: os madraços, que não “vergam a espinha” e os seus “beneméritos” por tantas e tamanhas “virtudes” ostentarem.
Inspirado nos chineses – daí o título – eu entendo que se quisermos ajudar alguém, em vez de lhe darmos o peixe é ensiná-lo a pescar, ainda que tenhamos que lhe dar também a cana, o anzol e mesmo a minhoca.
Alguns não quererão, mas abandonem os esmoleres a caridadezinha e talvez os encontremos um dia por aí à pesca, para seu bem e de todos nós.

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