segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Superstições, convicções e opiniões

Desde que me reconheço como pessoa, que comecei a ter percepção do meu comportamento, sempre primei por não só não acreditar em qualquer superstição como ter a enorme tentação de as contrariar, nomeadamente provocando aqueles que as têm, desde que tenha confiança e/ou laços familiares ou de amizade que mo permitam. Que me desculpem os supersticiosos, que eu respeito, obviamente, mas acho as superstições de tal modo ridículas que sou incapaz de deixar de as contestar. Às vezes, faço-o de forma tão obsessiva, que chego a pensar se tal obsessão, ela própria, por si mesmo, não será, de certo modo, uma superstição. Trata-se, apenas, de confirmar a mim mesmo e de demonstrar a quem comigo se relaciona e tem alguma das ditas, que elas não têm sentido. Devo confessar que, por tal comportamento, nunca fui vítima de qualquer malefício, o que faz com que me mantenha fiel aos meus princípios. Não acredito em superstições, como não acredito em mezinhas, atalhamentos, pragas, bruxarias, nos sonhos ou outras coisas que tais, apesar de um dia, já lá vão cerca de cinquenta anos, ter sido protagonista de um episódio, que confirmou em absoluto um sonho que minha mãe tivera nessa noite. Mesmo assim, para mim, tal como nessa altura, ainda hoje penso que se tratou de uma mera coincidência. Mantenho-me incrédulo relativamente a todas essas coisas, na certeza de que nada disso me molestará.
Como exemplo de superstições contrariadas, que são muitas, vou referir apenas uma que se relaciona com o meu filho, quando era bebé. Antes mesmo de ele pronunciar qualquer palavra, punha-o frequentemente ao espelho para ele se ver. Um familiar ficava preocupado, afirmando que isso faria com que o menino viesse a não falar. Eu retorquia que isso não tinha qualquer sentido e insistia em colocá-lo em frente ao espelho, sobretudo quando o dito familiar estava presente. Mauzinho, eu, não?! Devo dizer e aqueles que com ele privaram, em pequenino, comprovam, que foi uma criança que falou de forma bastante perfeita, muito cedo. Aliás não conheci uma criança que falasse tão bem, tão novinho, até aparecer meu neto, seu filho que se equiparou e, posteriormente, minha neta, sua filha, que conseguiu ultrapassar o pai e o irmão, ambos tendo estado, muitas vezes, à frente de um espelho.
A par dessa predisposição para contrariar as superstições, sempre fui possuidor de uma outra, que mantenho, que é a de estar mais frequentemente do lado de fora do politicamente correcto, do que do lado de dentro, porquanto o politicamente correcto, é, com frequência, sinónimo de hipocrisia, de defesa de interesses particulares. Habituei-me, desde muito jovem, a dizer o que penso, independentemente das consequências, que algumas vezes, se traduziram em dissabores. Dissabores que, ao invés de me fazerem mudar de atitude, sempre me deram mais força para continuar a ser o que e como era. Sempre soube dizer sim e dizer não, em função daquilo que julgava ser a verdade, a justiça e não em função dos meus interesses. Felizmente, a frontalidade, de que me orgulho, sempre me foi reconhecida nos mais diversos “ofícios” em que estive envolvido. Confesso que algumas vezes, a minha voz foi quase única a defender determinadas ideias. Embora reconhecesse que seria mais fácil, mais cómodo, estar do outro lado da “barricada”, nunca tive receio de expor e defender aquilo que julgava ser o mais correcto. Não obstante, algumas vezes ser quase o único a defender certos pontos de vista, mais tarde viria a verificar-se que a razão estava do meu lado e a aprovar-se aquilo que anteriormente, solitariamente defendia.
Os meus já longos anos de vida e com experiências múltiplas em diversas áreas mostraram-me que há muitas pessoas, embora inteligentes, não se dão ao trabalho de pensar, de reflectir, de intervir. Não o fazem por comodismo e porque adoptam uma situação defensiva, de modo a que quando tiverem de tomar uma posição, ou seja, em último recurso, votar, o façam, não em consciência, mas de acordo com interesses pessoais ou hipocrisia reinante. Participei e continuo a participar em múltiplas reuniões, nomeadamente em assembleias-gerais em que a grande maioria dos participantes não manifesta uma opinião, não tem uma ideia. São quase sempre dois ou três, e sempre os mesmos, que reflectem, apontam caminhos, sugerem. Parece-me que tanta falta de ideias se deve mais a preguiça, do que a qualquer outro factor. Por outro lado, há aqueles que defendem publicamente não aquilo em que acreditam e/ou praticam, mas, hipocritamente, o que mais lhes interessa, de acordo com o meio em que vivem ou se movem. Exemplificando: há mulheres que praticaram abortos, que incentivaram abortos, há homens que incentivaram ou obrigaram mesmo à prática de abortos, para se esquivarem de responsabilidades, de escândalos. Pois bem: ouvido alguns desses personagens, quem os não conhecer fica regalado com deslumbrantes manifestações oratórias contra o aborto, em quaisquer circunstâncias.
Desde sempre houve homens e mulheres homossexuais. Aquando do meu cumprimento do serviço militar, em Lisboa, convivi com duas jovens assumidamente lésbicas, - estávamos em meados da década de sessenta - bonitas, inteligentes, cultas, ambas bem, profissionalmente, que viviam juntas. Nunca tive qualquer preconceito. Aliás, era um prazer falar com elas. Eu disse que viviam juntas. Eram felizes, mas da sua relação, para além da felicidade que sentiam por uma vida em comum, nada mais poderiam esperar. Sei que se estiverem vivas, juntas, hoje terão mais um motivo para estarem felizes. E porque não?! A negação de uma união legal acabaria, porventura, com a homossexualidade?! A ilegalização das casas de prostituição e o consequente impedimento de as prostitutas, enquanto tais, terem acesso a cuidados de saúde, porventura acabou com elas?! Claro que não.
Quantos homens e mulheres hão por aí, fruto de relações incestuosas? Onde estavam os puritanos e onde estão aqueles de cujos costumes se reclamam herdeiros?!
Há por aí muitas pessoas que de acordo com as vozes dos amigos e vizinhos acorrem assiduamente aos chamados bruxos ou curandeiros, contribuindo de forma generosa para o engrossar das contas bancárias destes, acreditando nos seus poderes sobrenaturais para as libertarem de doenças malignas, de feitiços, maus-olhados e outras coisas mais. Quando alguma dessas pessoas fala comigo, sabendo da minha repulsa por tais actividades, fá-lo sempre como nunca tivesse recorrido a tais serviços e fosse, tal como eu, incrédula em relação a tais poderes.
Seria bom que cada um tivesse coragem de defender as suas convicções, as suas crenças, as suas superstições. Basta de tanta hipocrisia.

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