segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Bom Ano

Estamos prestes a findar a primeira década do século XXI, portanto, a entrar numa nova década, exactamente o início de 2010. Estoiram-se os últimos cartuchos de 2009, de fracas recordações para muitos. A crise económica e financeira, à escala global, afectaria qualquer país, muito mais um de fracos recursos como o nosso e com tanta gente mais amiga de subsídios e de reformas forjadas ou “compradas” do que de trabalho. Na verdade, um país em que um grande número de pessoas pratica e aplaude o “chico-espertismo”, a vigarice; que se julga senhor de todas as liberdades, mas não admite a dos outros; ter todos os direitos, mas poucos ou nenhuns deveres; um país em que um grande número de trabalhadores, dos mais variados níveis, não produz o que a sua capacidade lhe permite e a seriedade exige, porque considera os patrões ou superiores hierárquicos como inimigos, as empresas como se lhe não digam mais respeito que não seja apenas o de lhe garantir o sustento, mesmo sem crise não pode ir muito longe.
Disse atrás que o 2009 foi de fracas recordações para muitos. Não disse para todos, porque é precisamente em tempos de crise, de dificuldades, que muitos enriquecem. A miséria, a desgraça de muitos é a fortuna de alguns, normalmente com poucos escrúpulos e demasiada ambição.
Na semana passada falei sobretudo da enorme hipocrisia que envolve o Natal, nomeadamente no que toca à assunção generalizada de que ele é, por excelência, a festa da família. Dizia eu que muitas vezes as virtudes – nunca serão virtudes quando se trata de actos hipócritas – estão voltadas para o exterior, para onde se dê nas vistas. E mais do que deixar de praticar as tais virtudes tão apregoadas pelo Natal, mas que devem ser de todos os dias, no seio da família, praticam-se actos desumanos, ignóbeis, como colocar pais e avós em instituições hospitalares, deixando-os por lá abandonados. Confirmando isto que eu dizia, alguns órgãos de comunicação social davam conta de que tinham sido deixados abandonados em diversos hospitais centenas de familiares, com um único intuito, por certo, que era o de não perturbarem as festas. Num jornal, eu li que só num hospital de Lisboa, não sei se por lapso de impressão ou se de facto é verdade, estariam cerca de duas centenas de idosos que familiares lá deixaram, não os recolhendo, nem se preocupando como seu estado. Não será agora, por certo, em mais esta época para muitos de festa de arromba, apesar da crise, que esses mesmos familiares os irão recolher para lhes prejudicar os planos de folguedo. Provavelmente, algumas dessas pessoas andaram a exibir solidariedade onde ela desse nas vistas, talvez confortando outros idosos ou doentes, ignorando os de sua própria casa.
Creio que, se quisermos um mundo melhor, todos temos muito que reflectir sobre o nosso comportamento. Eu sugiro que cada um de nós se olhe ao espelho, não aquele espelho material, que nos envaidece ou desilude, mas aquele, imaterial, que nos mostra a alma. Não sabe como é? Isole-se, feche os olhos para que o ambiente que o rodeia não o desconcentre, abra a alma, reflicta sobre o que fez e não fez. Alije alguns laivos de egoísmo, de ingratidão, de vaidade, de deslealdade, que porventura encontre dentro de si, e, assim aliviado, imagine o quanto pode fazer de bem por si e pelos outros. Vai, certamente, descobrir uma infinidade de coisas que pode fazer, outras tantas que não deve fazer. Se todos fizermos isso e se cada um de nós realizar, ainda que seja um pouco do que se deveria fazer, estaremos a contribuir para tornar mais feliz a vida de todos nós, a contribuir para um mundo mais justo, mais fraterno, mais solidário, menos egoísta, menos hipócrita, menos materialista, enfim, um mundo melhor. Se cada um de nós se esforçar um pouco, se procurarmos recuperar e praticar os verdadeiros valores pelos quais todos nos devemos reger, aqueles valores universais, venham as crises que vierem, continuarão a provocar sofrimento e dor mais a uns do que a outros, mas, prenhes das virtudes e valores referidos, haveremos de as suportar e ultrapassar mais facilmente.
O termos ou não um bom ano de 2010 também depende de si, de mim, de todos nós. E depende muito dos políticos que temos. Dos que elegemos e dos que não elegemos. A muitos desses, infelizmente, não basta a reflexão e a hipotética vontade de serem melhores. Falta-lhes valores, competência, sobra-lhes egoísmo, incompetência, arrogância. Não se criam uns e eliminam outros de um dia para o outro, pelo que não esperemos o paraíso no ano que aí vem. Os políticos que temos, muitos deles que se não movem por convicções, que as não têm, mas pela defesa dos seus privilégios pessoais ou de grupo; políticos que hoje dizem uma coisa e amanhã o seu contrário, que não têm o menor pudor em lutar contra os adversários com toda a espécie de armas, ainda que as mais ignóbeis e ilegítimas, não nos poderão levar a bom porto, a menos que alguma Entidade interceda nesse sentido. Se crê em qualquer divindade, não desanime, ore-lhe. E digo-lhe não desanime, com toda a seriedade, com toda a confiança, não nos políticos, mas porque todos nós, os que não vivemos nem à sombra da política nem de nenhum político, embora combalidos pelo infortúnio, não deixamos que a esperança sucumba, como disse atrás, nós todos podemos fazer muito, inclusive, obrigar os políticos a serem melhores. Vamos a isso. Bom ano.

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